domingo, 14 de agosto de 2011

O meu coração é...

Meu coração é um álbum de retratos tão antigos que suas faces mal se adivinham. Roídas de traça, amareladas de tempo, faces desfeitas, imóveis, cristalizadas em poses rígidas para o fotógrafo invisível. Este apertava os olhos quando sorria. Aquela tinha um jeito peculiar de inclinar a cabeça. Eu viro as folhas, o pó resta nos dedos, o vento sopra.
Meu coração é um mendigo mais faminto da rua mais miserável.
Meu coração é um ideograma desenhado a tinta lavável em papel de seda onde caiu uma gota d’água. Olhado assim, de cima, pode ser Wu Wang, a Inocência. Mas tão manchado que talvez seja Ming I, o Obscurecimento da Luz. Ou qualquer um, ou qualquer outro: indecifrável.
Meu coração não tem forma, apenas som. Um noturno de Chopin (será o número 5?) em que Jim Morrison colocou uma letra falando em morte, desejo e desamparo, gravado por uma banda punk. Couro negro, prego e piano.
Meu coração é um bordel gótico em cujos quartos prostituem-se ninfetas decaídas, cafetões sensuais, deusas lésbicas, anões tarados, michês baratos, centauros gays e virgens loucas de todos os sexos.
Meu coração é um traço seco. Vertical, pós-moderno, coloridíssimo de neon, gravado em fundo preto. Puro artifício, definitivo.
Meu coração é um entardecer de verão, numa cidadezinha à beira-mar. A brisa sopra, saiu a primeira estrela. Há moças na janela, rapazes pela praça, tules violetas sobre os montes onde o sol se pôs. A lua cheia brotou do mar. Os apaixonados suspiram. E se apaixonam ainda mais.
Meu coração é um anjo de pedra de asa quebrada.
Meu coração é um bar de uma única mesa, debruçado sobre a qual um único bêbado bebe um único copo de bourbon, contemplado por um único garçom. Ao fundo, Tom Waits geme um único verso arranhado. Rouco, louco.
Meu coração é um sorvete colorido de todas as cores, é saboroso de todos os sabores. Quem dele provar, será feliz para sempre.
Meu coração é uma sala inglesa com paredes cobertas por papel de florzinhas miúdas. Lareira acesa, poltronas fundas, macias, quadros com gramados verdes e casas pacíficas cobertas de hera. Sobre a renda branca da toalha de mesa, o chá repousa em porcelana da China. No livro aberto ao lado, alguém sublinhou um verso de Sylvia Plath: “Im too pure for you or anyone”. Não há ninguém nessa sala de janelas fechadas.
Meu coração é um filme noir projetado num cinema de quinta categoria. A platéia joga pipoca na tela e vaia a história cheia de clichês.
Meu coração é um deserto nuclear varrido por ventos radiativos.
Meu coração é um cálice de cristal puríssimo transbordante de licor de strega. Flambado, dourado. Pode-se ter visões, anunciações, pressentimentos, ver rostos e paisagens dançando nessa chama azul de ouro.
Meu coração é o laboratório de um cientista louco varrido, criando sem parar Frankensteins monstruosos que sempre acabam destruindo tudo.
Meu coração é uma planta carnívora morta de fome.
Meu coração é uma velha carpideira portuguesa, coberta de preto, cantando um fado lento e cheia de gemidos – ai de mim! ai, ai de mim!
Meu coração é um poço de mel, no centro de um jardim encantado, alimentando beija-flores que, depois de prová-lo, transformam-se magicamente em cavalos brancos alados que voam para longe, em direção à estrela Veja. Levam junto quem me ama, me levam junto também.
Faquir involuntário, cascata de champanha, púrpura rosa do Cairo, sapato de sola furada, verso de Mário Quintana, vitrina vazia, navalha afiada, figo maduro, papel crepom, cão uivando pra lua, ruína, simulacro, varinha de incenso. Acesa, aceso – vasto, vivo: meu coração teu.

Caio Fernando Abreu

domingo, 7 de agosto de 2011

And there she goes...

Lá está ela, mais uma vez. Não sei, não vou saber, não dá pra entender como ela não se cansa disso. Sabe que tudo acontece como um jogo, se é de azar ou de sorte, não dá pra prever. Ou melhor, até se pode prever, mas ela dispensa.
Acredito que essa moça, no fundo gosta dessas coisas. De se apaixonar, de se jogar num rio onde ela não sabe se consegue nadar. Ela não desiste e leva bóias. E se ela se afogar, se recupera.
Estranho e que ela já apanhou demais da vida. Essa moça tem relacionamentos estranhos, acho que ela está condicionada a ser uma pessoa substituta. E quem não é?
A gente sempre acha que é especial na vida de alguém, mas o que te garante que você não está somente servindo pra tapar buracos, servindo de curativo pras feridas antigas?
A moça…ela muito amou, ama, amará, e muito se machuca também. Porque amar também é isso, não? Dar o seu melhor pra curar outra pessoa de todos os golpes, até que ela fique bem e te deixe pra trás, fraco e sangrando. Daí você espera por alguém que venha te curar.
Às vezes esse alguém aparece, outras vezes, não. E pra ela? Por quem ela espera?
E assim, aos poucos, ela se esquece dos socos, pontapés, golpes baixos que a vida lhe deu, lhe dará.
A moça – que não era Capitu, mas também têm olhos de ressaca – levanta e segue em frente.
Não por ser forte, e sim pelo contrário… Por saber que é fraca o bastante para não conseguir ter ódio no seu coração, na sua alma, na sua essência. E ama, sabendo que vai chorar muitas vezes ainda. Afinal, foi chorando que ela, você e todos os outros, vieram ao mundo.


Caio Fernando Abreu

sábado, 6 de agosto de 2011

"Save you from yourself, before you start to deal with everyone else"

Não creio que vá conseguir tirar algo de útil de tudo isso que vem acontecendo, desse vazio que estou sentindo, dessa depressão toda. Minha inspiração parece ter fugido de mim e para um desabafo, não acho que conseguiria transformar isso numa crônica ou em uma metáfora. Não quero maquiar nada, quero apenas arrancar daqui de dentro tudo isso que vem me fazendo mal ultimamente. Dramatizar um pouco, reclamar das injustiças do mundo todo. Dizer que não sou adequada a nada, nada que me proponha a fazer. Dizer que meus pais não me compreendem, coisa da qual nunca reclamei. Reclamar da vida. Mas então paro por apenas um segundo e percebo o quão ridícula estou sendo, por não conseguir me mover, tanto física como psicologicamente falando. Não consigo me mover e procurar uma ajuda qualquer. Poderia usar uma desculpa pra beber até cair e então me entorpecer, pois aí eu esqueceria. Mas nem isso me sinto habilitada a fazer. É um vazio tão grande... Um vazio que eu não imaginava que fosse realmente possível de se sentir. E não sei nem se é doloroso mais. É apenas vazio, escuro e seco. O vazio da falta de obrigações na minha vida. Vazio da falta do que lutar. Ou talvez por ter muito pelo que lutar e não ter incentivo algum.

Parece egoísmo falar deste modo, quando seus pais olham pra você e dizem que é só mais uma crise adolescente, que não há motivo algum para uma depressão como essa, pois "eu tenho tudo". Eu não tenho tudo. Quando me vejo obrigada a me refugiar em um mundo que nem existe, vejo o quão perdida e sem rumo eu estou. Pessoas que eu queria próximas de mim por achar que as que eu já tenho aqui não são suficientes e apenas para salientar ainda mais a minha solidão. Perceber que ninguém compreende o que você está querendo dizer e enquanto você fala, repete e repete mais mil vezes, os pensamentos de quem está ali do seu lado estão longe, muito longe. Você apenas conversa com corpos que não estão sequer lhe dando ouvidos e repetem roboticamente expressões já gravadas na memória. "Esqueça isso porque não vale a pena". "Não acredito que ainda está se sentindo assim por isso". Ou mesmo "cresça". Eu adoraria crescer, mas quando me vejo nessa situação toda onde pareço não ter uma saída, gostaria de ter estacionado. Vejo que não é nem um pouco fácil conviver no mundo adulto. Num mundo onde um é mais hipócrita que o outro. Onde pessoas vão passar por cima de você e sorrir como se nada tivesse acontecido. Onde pessoas vão te enganar, mentir pra você.

E eu já estou cansada de tentar mostrar pra todo mundo que eu estou bem, enquanto passo dia após dia dentro do meu próprio quarto. Criei um mundo confortável aqui dentro e adquiri o medo. O medo que eu nunca tive de sair lá fora e lutar pelo que eu mais queria. Pessoas nos transformam em seres mais fracos, ao invés de fortalecerem a sua mente, eles apenas te enfraquecem mais ainda. Te trazem para baixo e mostram o quanto você é melhor quando está sozinho. Deveria ser nobre e digno querer alguém, necessitar uma presença amiga ou até mesmo um amor. Mas dia após dia eu me vejo cercada de gente que busca cada vez mais a solidão. Porque é mais fácil lidar consigo mesmo do que lidar com outras pessoas.

Não se pode aceitar as diferenças, não se poder ser diferente. Para estar bem com os outros, é de extrema importância não se mostrar. O mundo nos ensina a falsidade como arma de fogo para qualquer empecilho. Um sorriso já perdeu há muito tempo seu real significado e lágrimas já não comovem mais porque nunca é possível saber quando são verdadeiras. E toda a verdade agora se esconde em momentos íntimos, quando nos encontramos sozinhos em nossos quartos, presos dentro de nosso próprios pensamentos. Ali, num quarto escuro e isolado dentro de nossas mentes, está nosso verdadeiro "eu", que precisou ser trancado e escondido do mundo, nos obrigando a colocar em nossos rostos esse sorriso de simpatia. Até nossos pensamentos estão sujeitos a se trancarem num canto escuro de nossas mentes e, de certo modo, mesmo sozinhos, às vezes temos medo de lidar com nossos próprios pensamentos. Porque às vezes eles nos assustam, não nos conhecemos de verdade. O mundo nos proibiu da verdade.

E daqui de onde escrevo, de longe, mas talvez tão perto, presa em meu próprio mundinho, as coisas seriam menos complicadas se ninguém tivesse medo da verdade do outro. Mas quando se tenta dizer a verdade, tudo que dizemos, parece apenas um grande drama literário cheio de palavras bonitas, metáforas e lições de moral pra gente que gosta de ler. Mais nada. Vai passar batido como se fosse só mais um texto fictício e as pessoas vão passar por ele, ler, gostar. E fingir que é apenas uma revolta imaginária. Vão fingir que esse conflito interno não existe. Ninguém conhece ninguém por dentro e os únicos capazes de colocar um pouco mais de verdade no mundo somos nós mesmos.

Mas ninguém quer, porque a verdade assusta. E machuca.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Breakout

“Pensei que você já tinha mandado o Beckett pro inferno, Gabe...” McCoy comentou indiferente, dando uma longa tragada em seu cigarro e o oferecendo para mim em seguida, mas eu nem prestei atenção nele quando acenei para o longe, do outro lado do pátio, onde William estava e acenara para mim. Eu apenas sorri com um pouco de ironia para o meu amigo e saltei da arquibancada, onde estávamos sentados.

“É claro, caro Travie... Exatamente do mesmo modo que você vai mandar aquela sua namorada pra lá também.” Eu ri, ganhando um simpático dedo do meio do meu amigo, mas eu apenas lhe dei costas e atravessei o pátio, acenando para que William me esperasse. Ele logo se despediu dos amigos que quando viram eu me aproximando riram entre si, se entreolhando, mas eu apenas continuei parado ali, esperando William vir pra perto de mim e então o cumprimentei com um abraço, como sempre fazíamos.

“Como você está, Gabe?” Ele disse sorrindo, tirando seus cabelos do rosto de um jeito meio desajeitado e os prendendo atrás da orelha. Eu sorri.

“Bem, bem... Na verdade, você ficou sabendo que nós fomos desclassificados para o próximo torneio de basquete? Estou deprimido...” Eu disse, realmente demonstrado minha chateação por me lembrar daquilo. “Eu sabia que deveria ter treinado mais!”

“Tá brincando?” Ele disse quase espantado. “Você é o melhor jogador do time, Gabe!” Ele disse empolgado, mas eu acho que olhei para ele de um modo tão surpreso que aos poucos um tom avermelhado foi tomando conta das bochechas dele, até que ele estivesse com elas inteiramente vermelhas como dois tomates. E então ele mordeu o lábio inferior e abaixou a cabeça. “Eu acho, pelo menos...” Ele disse baixíssimo e provavelmente precisou de um esforço gigantesco para olhar novamente para mim.

Não perguntei “o quê”, não olhei para ele de um modo estranho para deixá-lo ainda mais constrangido. Na verdade, sempre admirei o modo como aquele garoto sempre dizia alguma besteira que me fazia sorrir, mesmo quando eu estava na pior das situações. E ele nem me conhecia muito bem, embora parecesse que me conhecia bem melhor que meus melhores amigos, ou aqueles que se diziam ser, pelo menos. Talvez porque William fosse um pouco mais atencioso que eles.

Às vezes, tudo que eu queria era ficar perto dele, apenas para me sentir bem daquele jeito. E, sempre chega aquele certo momento que, ou você pensa ou você age. E eu sempre preferi agir duas vezes antes de pensar.

“Você quer sair daqui, William?” Eu disse depois de um tempinho que permanecemos naquele quase desconforto momentâneo e ele sorriu. Só havia o pequeno detalhe de que eu nunca havia chamado William pra sair comigo. Nós, na verdade, nunca nos falávamos fora do colégio. Vez ou outra trocávamos algumas mensagens no Facebook, mas nada que significasse muita coisa, afinal, eu tinha os meus próprios amigos e ele os dele.

Ele fez uma careta engraçada e eu pude perceber que ele apertou com mais força os dedos na alça da mochila que estava pendurada em apenas um de seus ombros. William tinha essa mania de fazer essas caretas o tempo todo.

“Claro...” Ele e eu começamos a caminhar juntos para a saída do colégio. “Pra onde vamos?”

Eu soltei uma risada.

“Eu não tenho idéia. Mas estou com meu carro... Pensaremos em alguma coisa.” Eu pisquei para ele e ele sorriu, ficando um pouco corado. Não falamos mais enquanto atravessávamos o portão com tranqüilidade, como se não estivéssemos matando as aulas. O guardinha que cuidava do portão nesse turno era absolutamente camarada com os alunos, então era muito mais fácil matar as aulas do período da tarde.

Eu abri a porta do carro pra ele, embora soubesse que ele era um amigo como outro qualquer e que não fosse necessária toda aquela cortesia.

“Bem, você conhece esse lugar há muito mais tempo que eu...” Ele comentou e sorriu e eu apenas sorri de volta para ele. Era verdade, eu conhecia muitos lugares em Nova Jersey e, principalmente, um em especial. Mas não tinha certeza se era o lugar ideal para se levar um colega de escola que me considerava o melhor jogador de basquete do time. Travis e os outros não gostavam da minha amizade com William, diziam que era ruim pra minha imagem e que isso acabaria mal pra mim, pois o garoto era “estanho”. Quase podia ouvir a voz de Travis na minha cabeça dizendo para que eu não falasse mais com o Beckett.

“É, eu conheço um lugar.” Eu sorri confiante e acho que o desafio era o que mais me fazia ir afundo com isso.

Eu no fundo sabia onde estava me metendo e em que tipo de terreno eu estava pisando. E para ser realmente sincero, eu estava entrando cada vez mais naquele jogo apenas pelo desejo absoluto de saber o que aconteceria a seguir. Apenas porque não era convencional.

Durante o caminho, William se manteve entretido com os meus CDs, elogiando vários deles. Eu não conhecia o gosto musical do garoto, mas a julgar pelos que ele escolhia para tocar e as faixas que preferia executar, tinha um ótimo gosto, bem similar ao meu. Isso era interessante, pois, eram poucos dos meus amigos que “combinavam” comigo por completo.

Mas ainda discordava plenamente da opinião de Travis sobre William estar “dando em cima de mim”. Sempre achei o Beckett um garoto tímido demais para dar em cima de alguém. Ele não tinha muitos amigos, tudo bem, eu podia compreender isso. Também não era realmente o tipo de garoto que as garotas preferiam, mas de qualquer forma, nunca achei que ele me “desse mole”.

Pude observá-lo olhar por todo o lugar, enquanto eu estacionava meu carro entre duas árvores próximas ao lago, numa espécie de bosquezinho numa parte bem afastada da cidade. Nós dois descemos do carro, enquanto William deixava alguma rádio que ele gostava tocando ali no rádio, num volume não muito alto. Então nós nos sentamos no capô do carro, ambos observando o horizonte, ao longe. Eu apanhei minha mochila, remexendo nas coisas ali dentro para buscar uma garrafa que havia dentro dela, jogando-a de canto no capô quando consegui o que queria. William então olhou para mim.

“O que é isso?” Ele indicou com um gestou, enquanto eu abria a tampa da garrafa, sentindo o forte cheiro de álcool que saía dela. Bebi um gole longo, a garrafa estava já pela metade e aparentava ser uma inofensiva garrafinha de água, eu então a ofereci para ele.

“Experimenta.” Sorri, no intuito de incentivá-lo e ele fez uma careta ao cheirar o bico da garrafa e depois disso beber um gole seco, que pareceu descer a contra gosto pela sua garganta o fazendo forçar uma careta desgostosa.

“Há quanto tempo faz que isso tá na sua mochila, Gabriel?” Ele reclamou, me entregando novamente a garrafa com nojo, limpando a boca com as costas das mãos.

“Umas três semanas, eu acho.” Eu ri, bebendo mais um gole e tampando a garrafa tranquilamente e a deixando também de lado. Passamos a observar o lago, que estava um pouco longe de nós, em um quase silêncio, que só era quebrado pela música ao fundo.

“Deve saber como fazer as garotas se sentirem especiais, não é, Gabe?” Ele comentou de um jeito até espontâneo no momento, mas depois ele começou a corar ao perceber o que havia dito e eu não consegui agüentar, acabei rindo. “Não... Não! Não foi isso que eu... Merda!”

“Relaxa, Bill.” Eu sorri, apoiando uma mão no ombro dele. “Relaxa.” Ele então me olhou.

“You make me dizzy running circles in my head

One of these days I'll chase you down

Well look who's going crazy now

We're face to face my friend,

Better get out.”

“Na verdade... Eu nunca cheguei a trazer ninguém aqui.” Eu confessei, desviando o meu olhar para o lago novamente. Eu, logo eu, não sabia o que estava fazendo. Logo, eu não podia ter controle algum sobre a situação.

“Eu agradeço pela parte que me toca!” Ele riu, dando um soquinho no meu braço, me fazendo rir também. E meus olhos se prenderam aos dele.

Poderia soar da maneira mais ridícula se eu dissesse que foi como um daqueles momentos idiotas de filmes românticos em que o par romântico acaba se olhado e o olhar de um é capturado pelo outro e então a tal “magia” acontece. E era completamente ridículo, mas no momento, era a única comparação boa o suficiente para descrever o momento mais estranho da minha vida.

E a verdade mais sincera da minha vida é que eu não fazia a mínima idéia do que esse garoto tinha que prendia tanto a minha atenção.

“You know you make me break out

make me break out

I don't want to look like that

I don't wanna look like that.”

William pousou uma das mãos sobre a minha coxa e permaneceu me olhando, enquanto mordia o lábio inferior demonstrando toda a incerteza de quanto poderia avançar com aquilo. E de certa forma, ele estava conduzindo a situação, pois parecia muito mais certo do que eu quanto ao que fazer. Eu estava, pela primeira vez, me deixando levar, me deixando conduzir. Eu não sabia nem se eu queria, estava apenas deixando que ele decidisse por mim. Me limitei a observar e obedecer. Mas não tanto quando ele se aproximou um pouco mais e invadiu meu território e eu instintivamente recuei. Não recuei porque não queria, recuei porque não conhecia aquele território. Recuei porque estava com medo de experimentar.

Mas eu queria. E dava pra ver.

“You can see this on my face

It's all for you

The more and more I take

I break right through.”

Ele sorriu, me passando uma espécie de confiança. Naquele momento eu tive certeza absoluta de que aquilo não era nada novo para ele, ou pelo menos, não tanto quanto era para mim. Mas eu deixei de recuar, querendo ou não, eu deixei. Ele apenas pressionou os dedos em minha coxa e sua outra mão contornou minha nuca, eu permanecia observando o rosto dele, que agora se aproximava do meu, mas eu não sabia o que fazer e como agir. Ele continuava sorrindo e isso de certa forma me confortava.

Meus olhos permaneceram abertos quando os lábios dele tocaram os meus e ele começou a massagear minha nuca. A boca dele só roçava contra a minha e, apesar de sutil, havia o toque levemente rude por ser uma boca masculina tocando a minha. Eu respirei fundo e fechei meus olhos e aos poucos fui abrindo meus lábios e deixando minha boca conhecer a dele. Ainda com receio, pousei a mão em sua cintura e o puxei pra perto e, de repente, eu já sabia exatamente o que fazer. Meus lábios tomaram conta dos dele e eu empurrei a minha língua pra dentro da sua boca, sentindo um calafrio percorrer toda a minha espinha quando nossas línguas começaram a se misturar e eu pude sentir o gosto da boca dele.

O toque era rude e até um pouco grosseiro, mas tinha um quê delicado vindo da parte dele. Ele me puxou um pouco para si e eu acabei por inclinar meu tronco sobre ele, fazendo com que William se deitasse no capô do meu carro e com isso, aprofundamos o beijo. Minha língua percorria todos os cantos da boca dele, enquanto ele mordiscava os meus lábios. Eu apenas separei minha boca da dele para tomar fôlego e olhar pra ele.

Poderia fugir naquele momento, mas o modo como ele sorriu para mim me fez beijá-lo novamente.

E agora eu sabia o que estava fazendo.

“Putting me on my back again.

I may be crazy, little frayed around the ends

One of these days I'll phase you out

Burn it in the blast off, burn it in the blast off

Watching me crawl away

Try to get out, try to get out

You know you make me break out

Make me break out.”

domingo, 12 de junho de 2011

"O melhor é não tentar olhar..."

De olhares tão firmes dos lábios mais finos
Que o melhor é não tentar olhar
As palavras saem sob efeito
De algo que não deveria provar

Olha ali está
As pernas e braços na pista convulsos que não querem parar
E é ali que está
O filtro de toda timidez que impede a disritmia dos movimentos

Os drinques e goles à fazem se soltar
Nunca se acostuma com efeitos que álcool proporciona

Ela está alta
Ela está...

As coisas mais loucas que ela diz
São perfeitas em ouvidos alheios
As coisas mais loucas...

Olho um instante para ela
Com seus sorrisos perigosos de embriaguez

Bailando em nuvens de nicotina no ar
Sob luzes piscantes
Tão coloridas

Já não há mais o que alimente ao tédio
Nem mais remédios para experimentar

Ela está alta
Ela está...

As coisas mais loucas que ela diz
São perfeitas em ouvidos alheios
As coisas mais loucas...

De olhares tão firmes e lábios mais finos
Que o melhor é não tentar olhar
Mantem-se de pé, é um milagre
Que faz essa menina continuar
Dizem aquela língua capaz de cortar
Falam ser do sexo frágil
Mas não se aplica em nada.

As Coisas Que Ela Diz, Colombia Coffee

sábado, 4 de junho de 2011

Tão inconveniente...

Você me liga nas horas mais impróprias
Você às vezes é tão indecente
Me diz mentiras que destroem a alma
E ainda me pede pra jurar, pra jurar amor pra sempre

Você me xinga pra vizinhança
E me despreza na frente dos amigos,
Me provoca enquanto dança

Conta a verdade
Toda a verdade quando não quero isso...

Você é tão inconveniente
E ainda quer que eu jure amor pra sempre.
Você é tão inconveniente
E ainda diz que vai me amar pra sempre.
Você é tão inconveniente
E ainda quer que eu jure amor pra sempre
E ainda diz que vai me amar pra sempre

Você é parte do que eu preciso
Mesmo quando penso que não é
Você é quase tudo o que eu quero
Mas sabe me tratar como um qualquer

Você me xinga pra vizinhança
E me despreza na frente dos amigos,
Me provoca enquanto dança.

Conta a verdade
Toda a verdade quando não quero isso...

Você é tão inconveniente
E ainda quer que eu jure amor pra sempre.
Você é tão inconveniente
E ainda diz que vai me amar pra sempre.
Você é tão inconveniente
E ainda quer que eu jure amor pra sempre
E ainda diz que vai me amar pra sempre

Você é tão inconveniente
E ainda quer que eu jure amor pra sempre
E ainda diz que vai me amar pra sempre
Você é tão inconveniente

E ainda quer que eu jure amor pra sempre
E ainda diz que vai me amar pra sempre.


Barão Vermelho

O apanhador de desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios.

Manuel de Barros

segunda-feira, 30 de maio de 2011

"Ela passa o tempo livre na frente do computador e toda a diversão que ela tem é sexo virtual com alguém que não pode tocar."

Tequila Baby

Take it or leave it

“Você não consegue se decidir nunca, Gabriel?” Pete me perguntou pela milésima vez, enquanto corria atrás de mim pela casa de um lado para o outro enquanto eu me aprontava pra sair. Tinha um encontro e o problema é que Pete me conhecia tão bem que sabia com quem era.

“Do que você está falando, Peter?” Era sempre mais fácil me fazer de desentendido, talvez ele não me perguntasse mais. Mas pelo espelho, enquanto eu ajeitava a gola da minha camisa, eu pude ver o reflexo de um Pete enfurecido girar os olhos e olhar pra mim decepcionado.

“Não adianta você tentar fingir logo pra mim. Você está indo vero Beckett, Gabe, eu sei disso.” Ele cruzou os braços. “Minha pergunta é: por quê?” Eu olhei pra ele, mas dessa vez eu fiquei sério.

“Pelo mesmo motivo que você já deve ter perdoado aquele seu namoradinho por pelo menos cem vezes.”

Depois disso, ele saiu de perto de mim e não falou mais. Não quis nem me dar tchau quando eu saí de casa.

Eu sei que ele não estava bravo comigo, que era apenas coisa de momento, mas de qualquer forma era melhor que ele não estivesse falando comigo, pelo menos na hora que eu ia sair. Pete sempre tinha um jeito especial de me fazer contestar as minhas escolhas e eu às vezes preferia apenas agir pelo momento e não pensar nas conseqüências após aquele momento.

E lá fui eu, seguindo e observando aquele trânsito movimentado de Manhattan, mas preferindo dessa vez ir de táxi, excluindo então o estresse no trânsito por ir com meu próprio carro. Pedi ao taxista que me deixasse uma quadra antes do apartamento dele e fui caminhando de lá, sentindo a brisa fria tocar meu rosto enquanto eu tentava não pensar em absolutamente nada. E normalmente quando eu queria me “bloquear” eu conseguia.

Quando cheguei à portaria do condomínio onde ele ficava quando vinha pra cá, pedi ao porteiro que me deixasse entrar sem me anunciar no interfone. Como ele já me conhecia ele acabou deixando sem fazer qualquer objeção. Também não optei pelo elevador, apesar de ter subido com bastante pressa e ansiedade os lances de escada até alcançar o quarto andar e depois caminhei com um pouco menos de pressa pelo corredor até parar diante daquela porta que eu conhecia tão bem.

Sem campainha, eu bati na porta. Eu sempre fazia aquilo, por algum motivo, sempre me senti na necessidade de agir do modo mais inesperado possível.

Alguns minutos foram necessários para que ele me ouvisse, mas ele sorriu involuntariamente ao abrir a porta e me ver ali parado.

“Eu te disse que viria...”

“É, você disse...” Ele mordeu o lábio inferior e sorriu novamente. “Entra...” E então afastou-se da porta para que eu pudesse entrar a fechando atrás de si.

(...)

Minha culpa acabava me acusando, mas era sempre bem menor quando eu me lembrava que nós não tínhamos mais um compromisso sério. Na verdade, eu o usava um pouco, isso era verdade. Mas ele também me procurava, isso abria portas para mim e ele bem sabia disso. Na verdade, estávamos sempre com as portas abertas. E eu não podia negar que ele tinha algo de mim que ninguém jamais iria ter. Eu sentia uma necessidade de ter uma dose dele, nem que fosse de vez em quando. Talvez eu fosse um pouco viciado.

Apenas mais um indício de que eu não prestava nem um pouco. Viciados nunca são de confiança.

terça-feira, 24 de maio de 2011

"Use filtro solar."

Se eu pudesse dar só uma dica sobre o futuro seria esta: usem o filtro solar! Os benefícios a longo prazo do uso de filtro solar estão provados e comprovados pela ciência. Já o resto de meus conselhos não têm outra base confiável além de minha própria experiência errante, mas agora eu vou compartilhar esses conselhos com vocês...
Aproveite bem, o máximo que puder, o poder e a beleza da juventude. Ou, então, esquece... Você nunca vai entender mesmo o poder e a beleza da juventude até que tenham se apagado. Mas pode crer, daqui a vinte anos você vai evocar as suas fotos e perceber de um jeito que você nem desconfia, hoje em dia, quantas, tantas alternativas se escancararam a sua frente e como você realmente tava com tudo encima. Você não tá gordo ou gorda.
Não se preocupe com o futuro. Ou então preocupe-se, se quiser, mas saiba que pré-ocupação é tão eficaz quanto mascar chiclete para tentar resolver uma equação de álgebra. As encrencas de verdade da sua vida, tendem a vir de coisas que nunca passaram pela sua cabeça preocupada e te pegam no ponto fraco às 4 da tarde de um terça-feira muito horrenda. Todo dia, enfrente pelo menos uma coisa que te meta medo de verdade.
Cante.
Não seja leviano com o coração dos outros. Não ature gente de coração leviano. Use fio dental.
Não perca tempo com inveja. Às vezes se está por cima, às vezes por baixo. A peleja é longa e, no fim, é só você contra você mesmo. Não esqueça os elogios que receber. Esqueça as ofensas. Se conseguir isso, me ensine. Guarde as antigas cartas de amor. Jogue fora os extratos bancários velhos.
Estique-se.
Não se sinta culpado por não saber o que fazer da vida. As pessoas mais interessantes que eu conheço não sabiam aos 22 o que queriam fazer da vida. Alguns dos quarentões mais interessantes que conheço ainda não sabem. Tome bastante cálcio. Seja cuidadoso com os joelhos, você vai sentir falta deles. Talvez você case, talvez não. Talvez tenha filhos, talvez não. Talvez se divorcie aos 40, talvez dance ciranda em suas bodas de diamante. Faça o que fizer, não se gabe demais, nem seja severo demais com você. As suas escolhas tem sempre metade das chances de dar certo, é assim pra todo mundo. Desfrute de seu corpo, use-o de toda maneira que puder, mesmo! Não tenha medo do seu corpo ou do que as outras pessoas possam achar dele é o maior instrumento que você jamais vai construir.
Dance! Mesmo que não tenha aonde além de seu próprio quarto.
Leia as instruções, mesmo que não vá segui-las depois.
Não leia revistas de beleza, elas só vão fazer você se achar feio!

Brother and sister
Together we'll make it through

Someday a spirit will take you

And guide you there
I know you've been hurtin'
But I've been waiting to be there for you
And I'll be there just helping you out

Whenever I can


Dedique-se a conhecer os seus pais. É impossível prever quando eles terão ido embora, de vez. Seja legal com seus irmãos. Eles são a melhor ponte com o seu passado e possivelmente quem vai sempre mesmo te apoiar no futuro. Entenda que amigos vão e vem, mas nunca abra mão de uns poucos e bons. Esforce-se de verdade pra diminuir as distâncias geográficas e de estilos de vida. Porque quanto mais velho você ficar, mais você vai precisar das pessoas que conheceu quando jovem.
More uma vez em Nova York, mas vá embora antes de endurecer. More uma vez no Havaí, mas se mande antes de amolecer.
Viaje. Aceite certas verdades inescapáveis: os preços vão subir, os politicos vão saracutiar, você, também, vai envelhecer. E quando isso acontecer... Você vai fantasiar que quando era jovem os preços eram razoáveis, os políticos eram decentes e as crianças respeitavam os mais velhos. Respeite os mais velhos. E não espere que ninguém segure a sua barra.
Talvez você arrume uma boa aposentadoria privada, talvez case com um bom partido, mas não esqueça que um dos dois pode de repente acabar. Não mexa demais nos cabelos, senão quando você chegar aos 40, vai aparentar 85. Cuidado com os conselhos que comprar, mas seja paciente com aqueles que os oferecem. Conselho é uma forma de nostalgia. Compartilhar conselhos é um jeito de pescar o passado do lixo, esfregá-lo, repintar as partes feias e reciclar tudo por mais do que vale.
Mas no filtro solar, acredite!

Brother and sister
Together we'll make it through

Someday a spirit will take you

And guide you there

I know you've been hurtin'

But I've been waiting to be there for you
And I'll be there just helping you out

Whenever I can


Everybody is free...

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Heartless

O amor é outra coisa...

Amor não é uma coisa que te tira do chão e te transporta para lugares onde você nunca esteve, o nome disso é avião. Amor não é aquela coisa que tira sua respiração e sua fala e te deixa totalmente sem ar, o nome disso é asma! Amor não é uma coisa que te ilumina no escuro, te leva até as estrelas, te traz de volta e desaparece sem deixar vestígios, o nome disso é abdução. Amor não é uma coisa que te pega de surpresa, te transforma em refém e toma de assalto tudo o que você tem o nome disso é ladrão. ”O amor é outra coisa, amor é outra coisa, amor é outra coisa, é outra coisa, é outra coisa.” Amor não é uma coisa que te embrulha o estômago e deixa marcas por onde passa, o nome disso é diarréia. Amor não é uma coisa que você guarda lá dentro e não deixa ninguém tocar e nem ver, o nome disso: vibrador! Amor não é uma coisa que chega sorrateira e pula o muro quando o dia amanhece, o nome disso é gato. Amor não é algo que foi perdido e quando é reencontrado pode mudar tudo o que está a sua frente, o nome disso é controle remoto.

(Velhas Virgens)

domingo, 22 de maio de 2011

Revenge is Sweet


Nunca pensei que o sabor da vingança pudesse ser de fato tão doce quanto os que já o haviam provado confirmavam ser. Talvez porque eu nunca tivesse realmente provado uma boa fatia desse prato saboroso que é a vingança, nunca tivesse degustado apropriadamente. Dizem que “vingança é um prato que se come frio”. Talvez meu prato ainda estivesse um pouco quente nas outras vezes e eu não pude sentir o verdadeiro prazer. Mas agora eu tenho um grande e delicioso prato de vingança bem gelada em minhas mãos e vou comendo pedacinho por pedacinho, dia após dia. E é gostoso.
Nunca imaginei que um riso pudesse ser tão aproveitado quanto um riso vingativo, mas tenho me deliciado em brincar e ser a dona do jogo dessa vez, só pra variar um pouquinho. E que prazer sem explicação saber que eu tenho o comando! Sou a Rainha no tabuleiro de xadrez e meus movimentos são quase infinitos. Quero ver agora, a garotinha boa que ficou má, mas as pessoas ainda acham que ela é a mesma garotinha boa. Boba.
Não, não mais. Aprendi a tal lição de cada coisa vem em seu devido tempo. E é uma delícia.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Sete Faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do -bigode,

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.


Carlos Drummond de Andrade

sábado, 7 de maio de 2011

I'm OK.

"Você deveria ao menos tentar dormir um pouco..." Pete se sentou ao meu lado, enrolado num cobertor com uma xícara grande e vermelha bem presa entre as duas mãos. Café, provavelmente.
Eu voltei meus olhos cansados para ele, mas apenas sorri, como se estivesse tudo bem, ou pedindo sem palavra alguma para que ele não se preocupasse e depois voltei minha atenção para o bloco de notas em minha frente. Eu estava tentando compor. E não estava, obviamente, funcionando.
"Você deveria ligar pra ele, talvez..." Ele falou de novo e outra vez eu desviei meu olhar e fiquei olhando para ele por alguns minutos, mas sem sorrir, eu estava era admirado dessa vez.
"Por que eu faria isso?" Uma de minhas sobrancelhas elevou-se automaticamente, proporcional ao tamanho da minha dúvida.
"Te ajudaria a se inspirar, quem sabe." Ele deu de ombros e depois bebeu um gole do que havia em sua xícara.
"Pensei que estivesse feliz por..." Ele ficou me olhando, mas eu não estava com humor pra começar uma discussão com ele. "Esquece, Wentz, esquece..."
"Não é porque eu o acho um idiota que você precisa se limitar a tudo que eu digo." Ele me olhava firme e severo agora, até me lembrava um pouco meu pai, exceto pelo tamanho do Wentz, o que era até engraçado, pois ele mesmo assim conseguia me amedrontar. "Olhe pra você, Gabriel. Eu estou aqui há uma semana tentando fazer você se sentir melhor, mas parece que nada tem esse poder."
"Pete... Eu estou bem." Eu forcei um sorriso, tentando ignorar todas as coisas que ele havia acabado de dizer. Ele girou os olhos irritado. "É sério. E além do mais..." Eu parei, antes mesmo de pensar se deveria contar-lhe aquilo.
"E além do mais...?" Mas já era tarde para me arrepender.
"Eu o encontrei ontem quando estava no supermercado. Ele me convidou pra ir até a casa dele, eu recusei e ele foi estúpido, saiu andando, feito uma criança." Pete colocou uma das mãos em meu ombro, eu apenas sorri. "Mas está tudo bem, sério."
"Tem certeza?" Eu sorri um pouco mais.
"Absoluta." Então Pete ligou a televisão. Eu desisti por aquele dia de tentar compor algo que prestasse, Pete dividiu comigo o cobertor que ele estava usando e assistimos a um filme qualquer na televisão. Era bom saber que eu teria o meu melhor amigo ali quando eu precisasse, fazia com que eu me sentisse seguro.

E todo mundo tá fudido...


Eles lhe fodem se você vai trabalhar, eles lhe fodem quando querem seu lugar, eles lhe fodem se você é um campeão, eles lhe fodem se você é um cuzão, eles lhe fodem quando você é uma gostosa, eles lhe fodem quando você é gulosa, eles lhe fodem se você fica calado, eles lhe fodem quando estão do seu lado, eles lhe fodem quando você marca touca, eles lhe fodem se você é bicha e louca, eles lhe fodem quando você contra ataca, eles lhe fodem se você é um babaca, eles lhe fodem se você é um negão, eles lhe fodem, baby, se você é um mulherão, eles lhe fodem se você é japonês, eles lhe fodem quando chega o fim do mês, eles lhe fodem se você é dedo-duro, eles lhe fodem quando você pula o muro, eles lhe fodem se você é um valentão, eles lhe fodem quando você tem razão, eles lhe fodem quando você vai votar, eles lhe fodem se você vai acreditar, eles lhe fodem quando a coisa fica preta. Eles lhe fodem e não é na buceta, mas esse caminho é tão comprido e todo mundo tá fudido.

Essa Linda Canção, Camisa De Vênus (Composição: Marcelo Nova / Karl Hummel)

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Point of no return

E lá está ele, no meio da pista de dança. E você está enganado se pensa que estou falando de Gabe Saporta. Eu falo dele, William Beckett. E ao redor dele, milhares de desconhecidos asquerosos tentando tirar proveito ou pelo menos uma "casquinha" daquele delicioso pedaço de carne. E Gabe? Gabe se limita a ficar no bar, observando. Assim como fazia há alguns meses atrás, quando ele apenas estudava esse garoto, o Beckett e ele fazia a mesma coisa. Mas uma coisa naquela cena, nos tempos atuais, apertava o coração de Gabe como se o esmagassem em um espremedor de batatas. Ele sabia quem William realmente era. Ele não era aquela pessoa egocêntrica, asquerosa e mesquinha que ele fazia questão de mostrar. William vestia tão bem aquela máscara que às vezes ficava difícil até mesmo para Gabriel conseguir encontrar a verdade ali. Mas Gabriel costuma dizer que podia olhar dentro do coração do tal do Beckett. Acho pura balela, se quer mesmo saber, mas ele jura com tanta sinceridade.
Nunca consegui ver, realmente, algo que prestasse em William Beckett. Talvez o fato de que ele fosse uma pessoa realmente bonita? Mas eu nunca achei isso uma qualidade, beleza exterior nunca é capaz de encobrir a podridão interior. Fui contra cada segundo que durou o relacionamento dele com Gabe. No entanto Gabe está arrasado. E irritado, pois foi ele quem terminou com William, ele acha simplesmente absurdo que ainda sinta as "dores" dessa decisão. William agora está beijando um cara mais alto e muito mais forte que ele, no meio da pista, mas não tem nem o pudor de afastar os outros que estão dançando ao redor dele. Agora um acaba de lhe trazer uma cerveja, ele simplesmente sorriu e se virou pra esse cara e o beijou também. Ele não pára de dançar e isso me dá nojo, repulsa. E Gabe está ali.
Antigamente era ele quem costumava tomar conta daquela pista de dança. Não consigo me conformar como alguém tão inteligente como Gabriel pode ser ao mesmo tempo tão tapado. Eu avisei tantas vezes sobre William. Eu disse para ele "amigo, essas putas não mudam só porque você deu a elas algo verdadeiro". William não era o tipo de puta que se vendia por presentes caros e coisas do tipo, ele se vendia na maioria das vezes por sexo e bebidas. Não creio que por toda Chicago exista uma pessoa que não seja amiga de uma pessoa que transou com William Beckett. Não é fácil ver seu melhor amigo tão pra baixo por causa de uma pessoa assim.
Mas Gabriel continua insistindo em querer observá-lo. Eu me pergunto então porque diabos esse idiota terminou com aquele outro idiota ali. A verdade é que nenhum dos dois está feliz. William gosta de esfregar a felicidade dele na cara de Gabe, mas Gabe o conhece o suficiente para saber que ele está blefando. Isso irrita William, ele fica sem armas quando se trata de Gabe Saporta. Mas ao mesmo tempo que ele perde as armas, acaba também desarmando Gabriel. Ontem tive vontade de socar a cara do meu amigo, ele disse que quase havia transado com o Beckett. E ele até estava animado quando em contou. E hoje está aí de novo, no mesmo canto do bar.
Poupo-lhes dos detalhes idiotas, mas a seqüência é provavelmente a seguinte: William vai transar com qualquer um. Depois vai vir esfregar isso na cara de Gabriel. Eles vão ter uma longa discussão daqui até o apartamento do William. E no final das contas Gabriel vai estar irritado e bêbado - e eu penso seriamente se isso deixa meu amigo meio retardado - porque eles vão acabar se agarrando na parede da sala do Beckett. E então ou ele vai embora, ou William vai inventar alguma coisa pra ele ter que ir. Ou eles vão transar, talvez.
Isso não faz bem ao Gabriel. E embora eu não vá nem um pouco com a cara do Beckett, também não faz bem a ele.
Todos os dias tento colocar isso na cabeça do meu amigo, mas ele é muito, mas muito cabeça dura. Experimente querer colocar qualquer idéia na cabeça de Gabriel. Vai ter um problema daqueles para fazer isso e talvez, certamente, você sequer consiga. Gabe não muda de opinião se ele disser que não vai mudar. Eu, como melhor amigo, tenho os privilégios de uma vez ou outra conseguir fazer ele enxergar as merdas que ele faz. Mas geralmente ele continua fazendo merda.
Me resta esperar que os dois percebam, ou que pelo menos Gabriel perceba, que ele fez uma escolha. E que ele precisa arcar com essa escolha, afinal. E mais que isso, ele precisa também entender que esse é um caminho sem volta. Não dá pra explicar quantas vezes eles já conseguiram dobrar esse caminho, mas uma hora ou outra eles vão ter que perceber isso. Não tem volta.
Às vezes eu queria que o meu amigo crescesse um pouco.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Memória fragmentada

“Fique quieta.” Ele ordenou, como se tivesse algum poder autoritário sobre mim. Mas eu continuei, atirando-lhe todas aquelas verdades na cara. Devia doer, pelo que eu conseguia calcular. Eu tagarelava insistente, enquanto ele entrava e saia forte de dentro de mim. Eu dava risada da minha própria desgraça.
Eu dizia ao contrário tudo aquilo que queria, eu odiava ao contrário. Pouco importava, acho que meu prazer estava sem ser usada. Nojo, deveria ter. De mim. E mais uma vez ele me mandava calar, mas eu não obedecia. Eu estava no controle, eu era a dona do jogo essa noite.
E eu era má. Parei, quando ele mais precisava.
Agora aprende.


(26/05/10)

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Don't Blame The World - Cobra Starship

I understand what you’re going through
I know exactly what you need, just take my hand
I’ll help you understand
It doesn’t matter what you’re going through
Just let it go ‘cause it don’t mean nothing now.


Hear me now just
Get, get, get on the beat now, beat now
Your troubles will stop when the DJ drops it.
Get, get, get on the beat
You’ll see your troubles fade when the lights go low so.


Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
I’ll save your soul, get on the floor, baby
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
I’ll save your soul, get on the floor.

That’s how it goes, so stop, stop looking for answers
‘Cause it don’t mean nothing now
You don’t know, know where to go when the world is turning upside down
It doesn’t matter what you’re going through
Just let it go ‘cause it don’t mean nothing now.

Gotta get down
Get, get, get on the beat now, beat now
Your troubles will stop when the DJ drops it
Get, get, get on the beat
You’ll see your troubles fade when the lights go low so.


Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
I’ll save your soul, get on the floor, baby
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
I’ll save your soul, get on the floor.

You sold your soul to rock and roll
I finally realized I don’t have to pay the price
To save my soul, I’m on the floor
Get your body moving, get your body right
Get your body moving, rock you all night.


Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
I’ll save your soul, get on the floor, baby
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
Don’t blame the world it’s the DJ’s fault
I’ll save your soul, get on the floor
It doesn’t matter what you’re going through
Just let it go ‘cause it don’t mean nothing now.

No fim, tanto faz.

Do buque de rosas que eu mandei pra ela hoje nenhuma única pétala ficou, eu acho que ela ainda não me perdoou. Então eu tive a grande idéia de uma serenata, levei uma pedrada que quase me matou. Eu acho que ela não me perdoou... Eu não sei o que há de errado, entender eu sei que não consigo. Se um dia eu for assassinado ela vai pro inferno comigo. Mulher difícil, que sacrifício! Fazei somente o que ela vos disser, não tem parada, não é piada. Pra você ver o amor como é. Se a mulher que você quer não te quer mais e você só foi perceber isso tarde demais, tudo bem, pois não faz a menor diferença no fim. Eu tenho amigos que gostam de mim, que não vão se importar se eu ficar com a garrafa de gim só pra mim.

terça-feira, 26 de abril de 2011

"I love you."


"Cassie, I'm shit with words everything always comes out so crap. But I've doing some thinking and everything is getting clearer. The thing is Cass, I've woken up this morning, and the sun's shining through the window and its making me think of you. Cassie it's not right you hiding away in that clinic you've got to get out in the world. Cassie I don't care if you think your odd, because I feel like singing when I see you, and your beautiful, and I've been such a fuckin' chapstick these past few weeks, and all I want to do this morning is sit on top of Brandon hill and hold you and tell you how wonderful you are, and I love you."

segunda-feira, 25 de abril de 2011

It still the greatest...

A última coisa que eu deveria fazer é citar as suas qualidades, uma vez que você me fez tanto mal naquele passado medíocre que nós tivemos. Mas quando eu penso nos seus braços ao meu redor me abraçando, parece tudo diferente de antes. Eu simplesmente me sinto segura pra esquecer todas as patifarias que você me fez e me sinto livre pra dar tanto à mim quanto à você uma nova chance. Das coisas que eu gosto no novo você, o carinho é algo que melhorou muito. Talvez eu nunca tenha deixado de ser um pouco escrava do toque das suas mãos. Suas mãos... Eu adoro as suas mãos, principalmente quando você mexe nos meus cabelos ou segura o meu rosto enquanto eu te beijo. Ou quando você me faz carinho com elas. Acho que definitivamente elas são algo de que gosto muito em você. Ainda me sinto culpada, claro. Ainda existe a Sherri. Ainda existe um mundo de erros e no meio desses erros eu acho difícil ter um acerto. Ainda está completamente errado, completamente fodido. Você continua sendo a pessoa errada pra mim. Mas mesmo assim eu tenho o seu apoio e o seu carinho. E isso chega até a contar pontos.
Você ainda é o mesmo filho da puta de sempre, Josh Baker. Eu não acredito em você mais. Mas de qualquer forma, suas mãos têm um efeito mágico sobre mim. E agora eu te odeio de um modo carinhoso, porque você me mostrou que merece esse ódio reservado que eu tenho. Esse ódio de querer sentir o contrário do que sinto. Esse ódio que se transfigurou tantas e tantas vezes. Você conquistou meu ódio, mas o meu ódio carinhoso. É com carinho que eu digo pra você ir à merda. Vai, tá certo? Mas esteja aqui quando eu precisar de um abraço, um ombro amigo e um pouquinho mais. O pouco mais da nossa amizade esquisita.